quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Os Olhos da Casa.

Na sala, os ouvidos do mundo
voltados pra televisão.
Os pais, a mãe, o avô, mudos
e o filho no quarto, na solidão.

Chegou atrasado na aula,
perdeu esperança em amor,
em cultura pra preencher o tempo,
e na rotina fincada ao longo dos dias.

Desamarrou os sapatos surrados,
num canto deixou a mochila
e dormiu, com cinco remédios pro sono
e outros três pro esquecimento.

De dia, na sala, todos acordam,
colocam no telejornal da manhã.
O pai, a mãe, o tio de ressaca, o avô, a irmã
tomam um café apressado de meias palavras,
de meios sentimentos engasgados,
junto com as bolachas,
o pão, e o talher.

No quarto ele continua dormindo,
num sono profundo, projétil pedante,
sem diálogo profano e o mundo ausente.
O ouvido do avô encosta na porta trancada,
queria saber o que se passava...
Mas de que adianta isso tudo, pensa ele,
põe os ouvidos no telejornal, na sala, na novela,
que se confundem,
e já saberás onde andam os ouvidos que ouvem essa casa.

Deu meio-dia no quarto
e ele nem havia acordado.
Dormiria mais uma vida em segredo,
se necessário.
Quem saberia do que seus olhos vêem?
Do que se anda pelo mundo
e os passos desabrigados que ele dá na rua?
Os olhos da casa estão virados,
os olhos da casa não enxergam a um palmo.
Todos estão ligados em outras coisas.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bonitas palavras, Mocinho.

Bernardo Sampaio disse...

obrigado.
:)