terça-feira, 18 de março de 2008

Dolores.

Se há tantas dores, Dolores,
e tanto mal,
por que não pões teu colar de flores
e sais pra brincar nesse carnaval?

Os vãos amores, Dolores,
são tão normais,
que eu seria pra ti, e antes fosse,
um amor a mais.

Eu sei que há tantos, Dolores,
tantos outros carnavais,
mas se hoje à noite não fores,
e eu não te ver jamais?

Que não chova nesse céu de mil sóis,
pra aclarar tuas pétalas de flores
e eu me proteger nos odores
dos teus cacheados caracóis.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Poema Egoísta.

Nessas horas que penso em mim, e que imploro pena por mim,
o que me importa o mundo e seus pormenores?
O que me importa a vida dos outros e a fome?
As invasões de terra, as enchentes, o lixo,
a preservação midiática dos recursos naturais hídricos,
da floresta Amazônica e a transposição de rios?

É o egoísmo, que carrego escrito em minhas mãos,
sujo em cada vão das minhas impressões digitais.
O que me vale a redenção católica?
O bem aos outros, o assistencialismo,
se toda essa ajuda é impressa, social-publicitária,
pneumatológica, escatológica, estratosférica,
e tão igual a esse meu egoísmo.

Eu vi a vida escorrer entre os meus dedos sujos de egoísmo,
fui tolo e ausente, sério, pálido, sistemático.
Não vi esperança, nem ódio.
E quem me dera eu tivesse visto o ódio...
Não haveria de ser tão doente,
cáustico e claustrofóbico.

Essa doença é como a de todos os outros,
que andam animais como tantos.
Ando devorador de pensamentos alheios.
Os reescrevo como meus, e os devoro.
Em todos os natais solidários.
Em todos anuários de votos em carnavais.
Em todos os sinais de trânsito,
e as fotos sorridentes de candidatos puros.

O que me importa, de novo, a dor alheia?
Os olhos fechados dos cegos,
as batalhas travadas entre os colossais egos de tantos demais.
O que resta agora sou eu,
com o egoísmo e a ironia,
sem a impertinência constante e confusa dos normais.

Soneto Estuporado.

Quem vê fossa não vê coração,
na saída fétida do esgoto,
onde eu perdi tempo e desgosto
e também a fala dos velhos tarados que passeiam às quatro e
[meia da manhã no calçadão. Que absurdo!

Meu poema tem cheiro estrúmico,
polisistêmico na concepção dos neologismos,
passando fetidamente distante do romantismo
só pra ter a certeza de se mostrar para todos, mesmo que
[equivocadamente, como um texto único.

Que idiota eu fui, meu Deus
em não ver esse estrume na calçada,
em não ter pensado, hoje, em absolutamente nada interessante.

Pra que falar agora do odor dos meus sapatos, então?
Se há tantos e tantos sufocos ocos e tapetes,
tantos cassetes e cacetes, que não temem nem fezes nem ascos.