segunda-feira, 18 de maio de 2009

A Menina dos Olhos Deturpados.

No relógio do vento
via as horas passar na copa das árvores,
no jardim de casa
via a terra viver com seus pequenos bichos,

Via cada detalhe de tudo,
os sons esquecidos por todos,
o faro despercebido,
com um tato faminto de criança.

A menina no jardim
via os pingos sobre o óleo da seiva,
os galhos retorcidos
da goiabeira,
os sonhos detidos entre as folhas.

Criava no jardim a sua horta,
plantando futuro,
e colhendo lembranças.

A menina entretida
percebia os olhares cegos
no canto da porta,
os passos dos gatos,
os uivos noturnos.
Cada fresta de corpo,
cada cheiro novo,
o preparo dos doces,
a mesa ao jantar,
e a fumaça do café
sob o frio úmido
daquele inverno.

A menina dos olhos abertos
a enxergar cada problema entre irmãos,
cada discórdia, cada vingança
e cada doença venérea.

A menina isolada,
que ao ver um simples garoto,
de um amor pequeno e bobo,
não viu mais nada adiante,
com os olhos detupardos de frio
e de calor ao mesmo tempo,
e sem entender direito
por que aquela vista,
tão acostumada a observar tudo,
reagia com um receio novo
àquela tão frágil descoberta.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Longe de Casa.

Lá longe,
numa casa isolada
num campo aberto
coberto de verde
e de ventania.

Lá longe
nas nuvens altas
aquela viagem,
as horas do dia
a divagar desejos
de não se entregar a si
e se tornar andarilho
de um mundo
que não é esse.

Lá longe
suavizando os sentidos
na sensação da brisa
a tatear as águas
a escutar o arrulhar
das pequenas aves,
onde só o alvoroço
dos ventos
é o alvoroço da vida.

Lá longe
nas nuvens soltas
num céu de quilômetros,
naquela árvore isolada
num topo de colina
e as pessoas estranhas
rostos sadios a viver
num espaço qualquer
na areia da praia
acima das rochas
acima de tudo
e o barulho de nada.

Lá longe
de mim,
lá longe
de casa.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Por Pouco.

Por que tão caótico
o terror de terminar
se teus ouvidos
eram somente
aluguel de minhas injúrias?

Pra quê penar por ti,
nesse medo de se dar,
se temer foi impedir
o que mal começamos?

Por existir e estar
propenso a viver,
suspenso no ar,
suplantei meu mal
pra falar a mais,
pra talvez cobrir
o que falavas de menos.

Por repetir
todas as frases que quis
e olhar teu vício latente
ora contente a refletir
o que te dizia,
ora inseguro com os desejos
e sentidos que eu declarava.

Por suportar o se
e suar num porém,
sacrificamos o que é
e o que possível seria,
num detrito de dúvida
a duvidar da liberdade
indulgente dos dias.

Pra quê fazer disso um tanto,
se um reles envolvimento
demandaria bem menos
e nos daria bem mais?

Pena, então,
perceber
que existir e ser
apenas,
nunca será
o suficiente.